quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Era uma vez um chá de panela

Eu posso até não casar mais (favor bater três na madeira depois que ler isso), mas eu orgulhosamente já tive um chá de panela. E foi uma experiência incrível. Organizado pelas minhas melhores amigas teve balões lilases e vasos de flores, castigos, coreografias, farinha, fantasias, risadas e ypioca de frutas vermelhas.
Maldita ypioca de frutas vermelhas, diga-se de passagem. No fim da noite mal conseguia me equilibrar, chorei para as amigas presentes pela incerteza dos fatos e repetia a mesma história cinco vezes. Algo me dizia que aquilo não estava certo.
Tomar a iniciativa para fazer o chá foi um verdadeiro parto, foi um processo de autoconvencimento. Algo me dizia lá no fundo da minha mente preconceituosa e do coração inseguro que as condições que eu estava aceitando não me permitiam ser digna de um chá de panela. Eu não iria me casar, iria morar com um namorado. Bateu uma incerteza de ser bem aceita. Uma disputa hipócrita entre o desejo de ser feliz e a busca do conto de fadas.
Muitas das minhas amigas pediram para ver as fotos que, fora eu e a amiga fotógrafa, ninguém viu. Com o tempo minhas amigas pararam de me cobrar, provavelmente imaginando que aquelas imagens me trariam lembranças tristes e que eu não queria tocar no assunto. E tinham razão.
No meio da última semana outra amiga me perguntou “eu não vou ver nunca mesmo aquelas fotos do chá né?”. Então pensei: e por que não escrever sobre ele? Respirei fundo, sentei em frente ao computador e decidi testar os meus limites escrevendo sobre algo que me traria lembranças insuportáveis.
Agora, ordenando os pensamentos, percebo que o chá me deu algumas certezas:
Primeira, seus amigos vão ser sempre seus amigos, nem que você case com um cara sete anos mais novo que trabalhe de garçom e te faça feliz ou com um cara sete anos mais velho, estável financeiramente e que te magoe cinco meses depois. Independente da situação minhas amigas estavam lá, cada qual com sua teoria, torcendo para que desse tudo muito certo na minha vida e contribuindo generosamente com panelas, copos, potes, açucareiro, jarras, lixeirinha, luva de fuxico, puxa-saco e porta pano de prato em formato de galinha.
Segunda, aprendi que posso contar muito mais com amigos do que com família. Da numerosa família do lado do meu pai que vive em Curitiba, duas tias foram ao chá, uma delas minha madrinha. Do lado da família da minha mãe, só mesmo a minha mãe (até por que 70% da família dela vivem em Santa Catarina). Mas não posso ficar chateada pela falta de adesão familiar. Eu terceirizei o convite, quem os entregou foi minha mãe. Recusei-me, talvez por já saber que isso aconteceria, talvez por não estar interessada nas críticas que receberia. Então nesse caso eu não aprendi nada, só confirmei que os amigos são a família que Deus nos permitiu escolher.
Terceira e última: Descobri que podemos ordenar nossos sentimentos e decepções em formas de gavetinhas no nosso cérebro, assim como brincamos que os homens fazem. Eu tirei o chá de panela da gaveta de momentos dolorosos para a gaveta de momentos importantes. O chá não era um momento doloroso, mas lembrava de um. O chá não teve culpa de nada e mesmo assim permiti que ele fizesse parte de um trauma. O chá foi uma experiência incrível da minha vida e acabei escondendo o fato de mim mesma por que ele me lembrava de algo ruim, pesado, penoso.
O chá foi uma divertida festa com minhas amigas que estavam lá para dizer que tinham uma consideração enorme por mim e que torciam para que tudo desse certo na minha vida. E tem motivo mais importante que esse para se comemorar? Hoje, com a alma lavada, posso dizer que orgulhosamente tive um chá de panela.
Tenho boas amigas sei que posso contar com elas.
São as famosas compensações da vida que sempre comento por aqui.

Ps1.: A utilização dos presentes na forma “dri dona de casa” durou pouco, cinco meses apenas, mas os presentes eu tenho certeza que vão durar bastante. A cozinha da minha mãe que o diga.

Ps2.: Esse é um muito obrigada, um pouquinho atrasado, para todas as pessoas especiais que estavam ao meu lado naquele momento e que, espero (rezo, torço, peço a Deus), permaneçam na minha vida sempre.

domingo, 29 de janeiro de 2012

Os feios também amam



Para quem entrou aqui achando que teria um texto sobre amor, dançou! Isto daqui esta bem mais para crítica social. E repensando no título agora, não deveria ser “os feios também amam” e sim “os feios, pobres e miseráveis também amam”.

Explico. Todos os dias no caminho para o trabalho o ônibus de cada dia passa exatamente por baixo do mesmo viaduto. Nele, pessoas dormem, comem, fazem suas necessidades, vivem e se amam. Sim, se amam! A cena dramática me chama atenção todos os dias, e não por que de fato é uma cena dramática, e sim por que sempre as mesmas duas pessoas, estão juntas, trocando carinhos, dormindo abraçados, dividindo um pão duro, um cigarro barato ou um gole de cachaça.

Claro que não me sinto a melhor pessoa do mundo por ter reparado nas duas pessoas se amando em meio aquela miséria, e não por aquilo ser uma miséria de fato. Não fiquei orgulhosa pela minha atenção ter sido chamada por um casal namorar em meio aquela podridão e não pela podridão em si.

Infelizmente cenas como essas já se tornaram normal no nosso dia a dia. Infelizmente nos acostumamos com essa pobreza alheia que nos parece até normal, pois “teoricamente” não nos diz respeito. Essa realidade já se adaptou a nossa urbanidade, desviamos, pulamos por cima, atravessamos a rua, fingimos que não vimos. Infelizmente!

Cada dia que eu passo pelo viaduto eu olho o casal e não entendo. Definitivamente eu não entendo. Cerca de cinquenta e cinco perguntas me passam na cabeça nesse momento. “Como eles chegaram nessa situação?”, “Como eles deixaram chegar nessa situação?”, “Será que isso é, de fato, falta de oportunidade”, “Será que isso foi uma opção?”.

Seres humanos normais não podem aceitar aquele tipo de vida para chamar de sua. O colchão que eles dormem está no chão há tanto tempo, está tão molhado de chuva e de urina que já apodreceu. Não existe mais uma espuma e sim uma mancha preta grudada na calçada. Os cobertores com que se cobrem estão tão encardidos que não sei mais dizer que cores eram quando novos. A falta de um banheiro os faz urinar e defecar ali do lado do lugar onde dormem e comem.

Diga-me, qual ser humano sonhou com uma vida dessas para si? Se me falarem que isso é falta de oportunidade, o argumento teria que ser muito bom. Eu não sei até que ponto acreditaria. Sempre existe alternativa: voltar para a cidade de onde veio; limpar privada no boteco da esquina em troca de um pingado e um pão com mortadela; pedir arrego para a prefeitura e seus milhões de projetos e bolsas sociais.

Agora se essa vida miserável for de fato uma opção, então eu desisto do ser humano. E ainda que seja uma opção, não parece uma decisão sensata, de pessoas centradas, psicologicamente saudáveis. O que significaria uma omissão por parte dos governos e da sociedade.

Existe alguma coisa errada nessa imagem de mendigos se amando felizes no meio da rua. Não por eles se amarem, sou defensora do amor, seja ele qual for, mas qualquer sentimento em meio a essas condições me assusta. Seria esse tipo de amor a verdadeira definição para a tal da “casinha de sapê”? Essa situação me lembra uma frase de Garcia Márquez, "El amor se hace más grande y noble en la calamidad".

Enfim, não sou cientista política, socióloga ou Madre Teresa de Calcutá. Sou uma comunicadora, humana o suficiente para me indignar com essa situação e corajosa (ou ingênua) o suficiente para acreditar que sempre temos escolha, que sempre existe segunda chance, que existe uma força maior dentro do ser humano capaz de fazê-lo mudar o rumo de suas vidas.

Queria que aquele casal (e todos os outros mendigos do mundo) acreditasse nisso também..

domingo, 8 de janeiro de 2012

Sorte

Esse é um post “meio” nojento, já vou avisando, por que nem só de poesia vive o homem.



Na Toscana dizem que quando o cocô de uma pomba cai na cabeça significa boa sorte. Não sei se esse ditado vale só na Toscana, ou em toda a Itália, por que ainda não conheci o país e porque por aqui nada ligado a cocô tem boa simbologia. Mas confesso que hoje de manhã pensei comigo mesma que não me importaria se um cocô bem grande de pomba caísse na minha cabeça.

Não que eu seja a pessoa mais azarada do mundo, nem de longe. Desculpem-me os azarados, mas, em algumas coisas eu até tenho sorte. Apesar de duvidar disso em algumas situações, como quando atravessando a rua, uma velha louca começa a gritar comigo e jogar cebolas na minha cabeça – pior foi só perceber na terceira cebolada, pois os fones de ouvido me impediram de ouvir os xingões – ou quando dois cachorros resolvem me atacar na rua quando eu passei do lado do dono deles que tinha acabado de subir em uma bicicleta. Mas isso acontece com todo mundo, quem nunca levou cebolas na cabeça ou foi atacado pelas criaturas que você mais gosta quando esta atrasada para chegar ao trabalho? Azar é só um termo de afeição e não uma condição permanente.

Pensando nisso no caminho de volta do mercado de domingo pedi aos céus um sinal. Eu queria muito um sinal, algo que me mostrasse que tudo ficaria bem, por mais confusa, receosa e amedrontada que estivesse me sentindo nesse dia. Foi quando um senhor não me viu atravessando ao lado do seu carro, deu uma escarrada que veio do útero (que ele não tem, claro, mas algo grande daquele jeito só poderia ter vindo do útero, pois o que saiu de sua boca foi praticamente um aborto) e cuspiu algo grande, verde e gosmento a um centímetro de meus pés. Parei, atônica, com a maior cara de asco do universo. O senhor, quando me viu, para não ficar para trás, fez a maior cara de susto do universo.

O que eu poderia fazer naquele momento? Ficaram os dois parados se olhando. Respirei, exclamei “que nojo”, fiz uma cara de “arghhh”, pulei a gororoba que saiu do pulmão do senhor e fui embora dando risada. Posso não ser a pessoa mais sortuda do mundo, mas ao menos sou um pouquinho otimista e quem sabe aquele foi o meu cocô de pomba curitibano?

Ou, no mínimo, eu sei fazer piada do próprio azar. Afinal, o que é mais difícil nessa cidade, uma pomba defecar justamente na sua cabeça quando sobrevoa um céu cinza infinito ou um senhor distraído, resfriado (dentro dos muitos que habitam a capital paranaense e que sofrem frequentemente com as mudanças climáticas constantes desse lugar) e um pouco mal educado digamos por soltar um catarro gigante em qualquer lugar. Achar que estava sozinho na rua de uma cidade de 1.851.215 habitantes é egocentrismo demais, não?

Catarro, eu falo catarro, não é nada elegante, eu sei. Modéstia a parte, mas podemos comparar como uma mulher de salto alto comendo asinha de frango frito, não é nada sexy, eu garanto. Mas se Chico Buarque pode cantar bosta e puta em uma música e continuar perfeito, eu posso escrever catarro, escarro e gororobas e continuar uma tentativa de “blogueira”, certo? Ou simplesmente falando da vida, para quem quiser ler algo diferente e nesse caso um pouco nojento.

Chegando em casa liguei a TV e adivinha? Estava passando “Sorte no Amor”, aquele filminho teen com a Lindsay Lohan. Achei graça demais na coincidência, já que tudo que eu havia pensado o dia inteiro era exatamente essa tal de sorte no amor, se é que ela existe. Vou jogar na mega sena amanhã, não dizem que sorte no amor equivale a azar no jogo? Segundo Leminski, “sorte no jogo, azar no amor, de que me serve sorte no amor se o amor é um jogo e o jogo não é o meu forte, meu amor?"


Enfim, acredito em sinais, acredito em compensações da vida, como aquelas que acontecem no primeiro dia do ano quando você passou a manhã em crise de choro e a noite recebe uma mensagem daquelas que te faz suspirar ou quando você está cansada, numa viagem longa de  ônibus voltando para casa, tudo que quer é dormir e recebe outra mensagem, daquelas que te tira o sono porque o tamanho do teu sorriso é incompatível com a vontade de fechar os olhos e não pensar em nada.

E assim caminha a humanidade, com muito mais compensações do que questões de sorte ou azar e com muito desejo de que tudo dê certo, um dia, quem sabe logo, se depender dos meus estranhos, e um pouco asquerosos, sinais.